Os Limites da Vigilância: Os Ataques Terroristas na Europa

Texto de Gabriel Lima
Fontes: The Atlantic, Zygmunt Bauman e Jean Beaudrillard

George Orwell em seu famoso livro 1984, influenciado pelo momento em que vivia, criou uma das maiores visualizações do fascismo e da vigilância na literatura ocidental. Um mundo onde os cidadãos são controlados até mesmo dentro de suas próprias mentes, e mesmo os movimentos rebeldes são criações do estado para caçar e punir possíveis "traidores" do partido. Apesar de ter sido escrito no período logo após a segunda guerra e se centrar no avanço do stalinismo, as ideias de Orwell se relacionam com os recentes acontecimentos na Europa em outros países

O Outro

O sociólogo e ensaísta Zygmunt Bauman discute sobre a presença do "outro" na sociedade. O outro é sempre o estrangeiro, o imigrante e o rebelde. Aquele que não se adapta aos valores e a cultura da população em geral. O estranho ou "o outro", vive a margem da sociedade e em casos de revolta contra uma determinada questão são os primeiros a sentir o ódio e a comoção das massas. Isso vêm acontecendo na Europa já desde muito tempo, não se tratando de um problema recente.

Antes de prosseguirmos vale lembrar um pouco da história das relações entre a Europa e o Oriente Médio.

Mesquita de Córdoba, Espanha
Durante boa parte da antiguidade clássica, as civilizações do oriente médio, influenciaram as culturas que viriam a surgir no mediterrâneo, principalmente os gregos e os romanos. Já na Idade Média, a Europa havia sofrido com a expansão do cristianismo, enquanto o Oriente Médio se tornava predominantemente islamizado. Durante os séculos VIII e XIV, reinos islâmicos chegaram a existir em alguns locais da Europa, principalmente na Espanha. Durante o século XIX, a situação se inverteu e os países europeus passaram a colonizar os países do Oriente Médio. No século XX, a maioria desses países conquistaram sua independência. A descoberta do petróleo no Oriente Médio aumentou o interesse das nações nessa região o que tem levado à diversos conflitos.

Com a recente guerra cívil Síria, centenas de milhares de refugiados se dispersaram pelo mundo, principalmente para a Europa e alguns países do Oriente Médio. No entanto, o sonho de viver na Europa acaba atraindo mais refugiados para esse continente. Não é somente o American Dream que ilude populações de países pobres, mas também o European Dream, a noção de que a Europa é uma ilha de prosperidade e tranquilidade em mundo conturbado. No entanto, como sabemos a imigração é uma faca de dois gumes; tanto existe a necessidade daquele que imigra, como a necessidade de mão de obra baratá.

Essa questão deve ser analisada com mais complexidade. Com a crescente população idosa na Europa, devido ao crescimento da expectativa de vida, e a decrescente população jovem, a mão de obra tem se tornado escassa na Europa. As populações jovens, possuem maior nível de formação profissional e demandam melhores empregos, deixando todo um nicho do mercado de trabalho, aberto para imigrantes. Setores como a industria têxtil e os serviços de limpeza urbana, contratam esses imigrantes em grandes números.

É bastante cômico observar os setores conservadores da sociedade comentarem sobre a "invasão" desses imigrantes, que "roubam o trabalho" dos europeus. Esse discurso é utilizado também em outros países, inclusive o nosso. À bem verdade, muitas empresas preferem contratar empregados imigrantes, por vezes ilegais, já que o salário minimo não precisa ser respeitado e os mesmos não possuem nenhum direito trabalhista. Cria-se então com essa população, um antagonismo. Os Sírios, passaram à ser o "outro" de Bauman, aquele elemento da sociedade que não se enquadra nos padrões estéticos, sociais e religiosos da sociedade europeia.

Pânico fabricado

Não irei aqui defender teorias da conspiração, mas, é importante observar como os ataques terroristas tem sido utilizados pelas forças de segurança dos países da Europa, como pretexto para forçar a aprovação de leis que restringem a liberdade dos habitantes. Segundo o site The Atlantic, com as novas leis de restrição, a França prendeu mais de 200 manifestantes durante os protestos contra a Conferencia Global sobre o Clima. Essas atitudes demonstram que a França, assim como outros países do continente, tem se utilizado da comoção criada pelos ataques para criar elementos que barrem o discurso livre e o direito de protestar. Essas medidas constituem a emergência de um "Estado Policial".

Esse episódio remete ao caso do 11/9, quando o congresso americano aprovou leis que aumentavam o poder das agencias de vigilância. O fato é; muitas vezes essas leis são utilizadas contra os próprios cidadãos do país. O documentos vazados por Edward Snowden, revelaram a imensa quantidade de informações e escutas ilegais que o governo do estados unidos realizaram. Sera que todo esse pânico não é fabricado com o intuito de restringir as liberdades e  aumentar o poder da já estabelecida classe dominante?

Vivemos em mundo onde a mídia controla as opiniões, e os conceitos são superficiais e distantes de uma realidade objetiva. Controlar uma população através das imagens e da falsificação da verdade, pode não ser uma questão restrita ao livro de Orwell.


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Texto de Gabriel Lima
Fontes: The Atlantic, Zygmunt Bauman e Jean Beaudrillard

George Orwell em seu famoso livro 1984, influenciado pelo momento em que vivia, criou uma das maiores visualizações do fascismo e da vigilância na literatura ocidental. Um mundo onde os cidadãos são controlados até mesmo dentro de suas próprias mentes, e mesmo os movimentos rebeldes são criações do estado para caçar e punir possíveis "traidores" do partido. Apesar de ter sido escrito no período logo após a segunda guerra e se centrar no avanço do stalinismo, as ideias de Orwell se relacionam com os recentes acontecimentos na Europa em outros países

O Outro

O sociólogo e ensaísta Zygmunt Bauman discute sobre a presença do "outro" na sociedade. O outro é sempre o estrangeiro, o imigrante e o rebelde. Aquele que não se adapta aos valores e a cultura da população em geral. O estranho ou "o outro", vive a margem da sociedade e em casos de revolta contra uma determinada questão são os primeiros a sentir o ódio e a comoção das massas. Isso vêm acontecendo na Europa já desde muito tempo, não se tratando de um problema recente.

Antes de prosseguirmos vale lembrar um pouco da história das relações entre a Europa e o Oriente Médio.

Mesquita de Córdoba, Espanha
Durante boa parte da antiguidade clássica, as civilizações do oriente médio, influenciaram as culturas que viriam a surgir no mediterrâneo, principalmente os gregos e os romanos. Já na Idade Média, a Europa havia sofrido com a expansão do cristianismo, enquanto o Oriente Médio se tornava predominantemente islamizado. Durante os séculos VIII e XIV, reinos islâmicos chegaram a existir em alguns locais da Europa, principalmente na Espanha. Durante o século XIX, a situação se inverteu e os países europeus passaram a colonizar os países do Oriente Médio. No século XX, a maioria desses países conquistaram sua independência. A descoberta do petróleo no Oriente Médio aumentou o interesse das nações nessa região o que tem levado à diversos conflitos.

Com a recente guerra cívil Síria, centenas de milhares de refugiados se dispersaram pelo mundo, principalmente para a Europa e alguns países do Oriente Médio. No entanto, o sonho de viver na Europa acaba atraindo mais refugiados para esse continente. Não é somente o American Dream que ilude populações de países pobres, mas também o European Dream, a noção de que a Europa é uma ilha de prosperidade e tranquilidade em mundo conturbado. No entanto, como sabemos a imigração é uma faca de dois gumes; tanto existe a necessidade daquele que imigra, como a necessidade de mão de obra baratá.

Essa questão deve ser analisada com mais complexidade. Com a crescente população idosa na Europa, devido ao crescimento da expectativa de vida, e a decrescente população jovem, a mão de obra tem se tornado escassa na Europa. As populações jovens, possuem maior nível de formação profissional e demandam melhores empregos, deixando todo um nicho do mercado de trabalho, aberto para imigrantes. Setores como a industria têxtil e os serviços de limpeza urbana, contratam esses imigrantes em grandes números.

É bastante cômico observar os setores conservadores da sociedade comentarem sobre a "invasão" desses imigrantes, que "roubam o trabalho" dos europeus. Esse discurso é utilizado também em outros países, inclusive o nosso. À bem verdade, muitas empresas preferem contratar empregados imigrantes, por vezes ilegais, já que o salário minimo não precisa ser respeitado e os mesmos não possuem nenhum direito trabalhista. Cria-se então com essa população, um antagonismo. Os Sírios, passaram à ser o "outro" de Bauman, aquele elemento da sociedade que não se enquadra nos padrões estéticos, sociais e religiosos da sociedade europeia.

Pânico fabricado

Não irei aqui defender teorias da conspiração, mas, é importante observar como os ataques terroristas tem sido utilizados pelas forças de segurança dos países da Europa, como pretexto para forçar a aprovação de leis que restringem a liberdade dos habitantes. Segundo o site The Atlantic, com as novas leis de restrição, a França prendeu mais de 200 manifestantes durante os protestos contra a Conferencia Global sobre o Clima. Essas atitudes demonstram que a França, assim como outros países do continente, tem se utilizado da comoção criada pelos ataques para criar elementos que barrem o discurso livre e o direito de protestar. Essas medidas constituem a emergência de um "Estado Policial".

Esse episódio remete ao caso do 11/9, quando o congresso americano aprovou leis que aumentavam o poder das agencias de vigilância. O fato é; muitas vezes essas leis são utilizadas contra os próprios cidadãos do país. O documentos vazados por Edward Snowden, revelaram a imensa quantidade de informações e escutas ilegais que o governo do estados unidos realizaram. Sera que todo esse pânico não é fabricado com o intuito de restringir as liberdades e  aumentar o poder da já estabelecida classe dominante?

Vivemos em mundo onde a mídia controla as opiniões, e os conceitos são superficiais e distantes de uma realidade objetiva. Controlar uma população através das imagens e da falsificação da verdade, pode não ser uma questão restrita ao livro de Orwell.


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