Deus existe? Uma análise sobre o mito do deus judaico-cristão - Parte I

Desde os primórdios da humanidade, temos nos questionado quanto a existência de um criador para o mundo e o ambiente em que fomos postos. Não é difícil de analisar o porquê dessa pergunta, já que ela parte de indivíduos membros de uma especie criadora, capaz de utilizar tecnologias. Logo toda criatura tem que ter um criador. E a história da humanidade até então, tem sido uma constante batalha de diferentes ideologias sobre quem ou o que afinal de contas criou o mundo, e mais recentemente, alguns se indagam como o mundo se originou (e não como ele foi criado).

Reações humanas básicas; entende-las é essencial
para a vida em grupo. 
A primeira lente que iremos utilizar para analisar a questão da existência de deus, e a neurociência, mais especificadamente uma área conhecida como "teoria da mente". A "teoria da mente", assim chamada, visa estudar os mecanismos que induzem a percepção da própria mente ou consciência, e a percepção da mente de outros. A capacidade de entendem a mente do outro é imprescindível para um grupo de animais que vivem em conjunto, e acontece que a nossa especie vive em grupos.

Essa necessidade de entender o outro, da vazão a efeitos colaterais, ou seja, a capacidade de perceber mentes em objetos ou coisas desprovidas de mente. O céu, uma pedra, um evento climático ou mesmo um sentimento, passam então sobre a perspectiva humana a possuírem vontades e desejos. 

OS PRIMEIROS INDÍCIOS DE COMPORTAMENTO RELIGIOSO

Venus de Willendorf
Formas de religião são muito antigas e remontam a até 300.000 anos atrás, período em que teriam surgido o Homo Sapiens e o Homo Neanderthal. Sabemos que a o comportamento religioso surgiu nesse momento, devido a atividades não naturais ligadas ao que hoje em dia consideramos como religião, como o habito de
enterrar os mortos com pertences. No entanto, formas mais sofisticadas de comportamento religioso, começam a emergir somente em meados do Paleolítico, cerca de 30.000 anos atrás. Nesse período, temos o registro material de diversos objetos com conotação teoricamente religiosa, entre eles, talvez o mais conhecido, a Venus de Willendorf. Essa figura, representando possivelmente uma mulher grávida, tem sido caracterizada como a primeira imagem de uma figura religiosa ligada a fertilidade. 

Sepultamento paleolítico 
Podemos perceber que o pensamento religioso, tem acompanhado nossa especie desde os seus primórdios, o que corrobora  com a teoria da mente. Ao longo de todo o período Paleolítico e do Mesolítico, o comportamento religioso teria se sofisticado, e na revolução agrícola, que teria acontecido por volta de 10.000 anos a.C (periodo Neolítico), teria em conjunto com a vida sedentarizada, criado uma enorme gama de religiões, complexas, centradas no culto à natureza e aos animais.


A ANTROPOMORFIZAÇÃO DA RELIGIÃO 

Quando a civilização sedentária e urbana chegou no seu clímax durante o período conhecido como Idade do Bronze, vemos a emergência de centenas de cidades estados, organizadas em uma classe dominante, detentora das terras e das armas, e outra camponesa. A divisão do trabalho acentuada por essa dinâmica
Deus sumério, Enki
social trouxe a tona novas tecnologias, como a roda, a escrita, a matemática e a metalurgia. Logo, a religião até então voltada à natureza, se voltou para o homem, e os deuses ganharam rostos humanos. Não é a toa que os deuses antigos eram associados a criaturas, como Zeus na mitologia grega, associado ao Boi, ou à Águia. Zeus não era o único a ser associado a esses animais, El, Baal, Hadad, Yawhe, Enki e Teshub, deuses do Oriente Médio e Levante, também eram associados a esses animais. Esses deuses eram patronos dos Céus e das chuvas, regendo a fertilidade das plantações, e por consequência, a sobrevivência desses povos. Não é por acaso que os deuses ligados a chuva e aos céus, tenham lugar de destaque em diversos panteões.

Um desses deuses, ficaria extremamente famoso em séculos vindouros, mas no período de 1000 a.C à 300 d.C, era apenas mais um deus no mundo antigo. Estamos é claro falando dele, o deus dos judeus, dos cristãos e dos muçulmanos, Javé.

UM DEUS SEM NOME

Cultuado pelos povos canaanitas como um deus da fertilidade, das guerras e das chuvas, Yawhe (Javé), era só uma das inúmeras variações dos deuses mesopotâmicos, Teshub e Enki. Durante a expansão do império Babilônico, a região do Levante caiu sobre as armas dos reis babilônicos, o que levou os "hebreus" ao cativeiro, ou ao exílio, depois do evento conhecido como destruição do primeiro templo. Durante anos os hebreus, viveram sobre a sombra da ameaça babilônica, nesse momento, um grande senso de nacionalismo surgiu no seio da sociedade hebraica. Um dos efeitos desse nacionalismo, foi o henoteísmo, ou seja, a preferencia a uma divindade, que era colocada como "a mais poderosa", mas sem deixar de crer em outros deuses, por exemplo, a deusa Astarte, que era então considerada como esposa de Yawhe. 

Após a derrota do império babilônico contra os persas, os hebreus foram soltos do cativeiro, e puderam retornar a suas terras, e obtiveram uma certa autonomia. Ciro, o grande, rei dos persas, foi nomeado pelos hebreus de "messias", que em hebraico significa algo ungido com óleo, algo sagrado. Por ter "libertado" os hebreus, os persas foram então considerados aliados, e por consequência, grandes trocas culturais se seguiram.

Nesse contexto histórico (cerca de 600 à 300 a.C), os persas seguiam o Zoroastrismo, religião monoteísta,
baseada nos ensinamentos de Zaratustra. O Zoroastrismo pode ser classificado como uma religião maniqueísta, onde existe uma clara divisão entre o sagrado e o profano, no caso, os pensamentos bons levam à boas ações, e os pensamentos maus à más ações. O Zoroastrismo, influenciou a religião hebraica em todos os quesitos, inclusive a crença em um futuro salvador, conhecido, no Zoroastrismo como Saoshyan. Mas talvez o maior fator influenciado, tenha sido a crença em somente um deus (O Zoroastrismo não era exatamente monoteísta, pois existiam dois deuses Spenta Manyu, pensamentos bons, e Angra Manyu, pensamentos destrutivos ou maus, mas podemos considera-lá monoteísta).

O monoteísmo então Judaico, iria se desenvolver ao longo dos séculos IV, III e II antes de Cristo, e culminar nos elementos que hoje conhecemos. A Torá (livro sagrado judaico, que compreende o Antigo Testamento cristão), teria sido redigida ao longo de todo o primeiro milênio a.C, contendo inúmeras influencias persas, mesopotâmicas e egípcias. No entanto, todas essa complexidade das religiões do mundo antigo, são apenas um reflexo da complexidade inerente a essas civilizações, mas os fatores que levam os seres humanos a crerem em deuses, ainda são os mesmos.

Na parte II, analisaremos o cristianismo, e o surgimento da ciência na elucidação da questão sobre a existência de deus?

Até lá.








   
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4 comentários
  1. Legal o texto :D
    Quando sai o 2?

    Se alguém se interessar em ler, esse também é bom:
    http://super.abril.com.br/religiao/quem-escreveu-biblia-447888.shtml

    ResponderExcluir
  2. Opa E-rick Vieira, tudo bem?

    Agradeço o elogio, estou ainda angariando as informações para a próxima parte, isso leva um tempo mesmo para mim que estudo esse assunto. Até sexta-feira entrego a parte 2.

    ResponderExcluir
  3. Show... voltando apenas para deixar uma dica... link as outras partes aqui para a pessoa acompanhar mais facil...

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Deus existe? Uma análise sobre o mito do deus judaico-cristão - Parte I

21:38


Desde os primórdios da humanidade, temos nos questionado quanto a existência de um criador para o mundo e o ambiente em que fomos postos. Não é difícil de analisar o porquê dessa pergunta, já que ela parte de indivíduos membros de uma especie criadora, capaz de utilizar tecnologias. Logo toda criatura tem que ter um criador. E a história da humanidade até então, tem sido uma constante batalha de diferentes ideologias sobre quem ou o que afinal de contas criou o mundo, e mais recentemente, alguns se indagam como o mundo se originou (e não como ele foi criado).

Reações humanas básicas; entende-las é essencial
para a vida em grupo. 
A primeira lente que iremos utilizar para analisar a questão da existência de deus, e a neurociência, mais especificadamente uma área conhecida como "teoria da mente". A "teoria da mente", assim chamada, visa estudar os mecanismos que induzem a percepção da própria mente ou consciência, e a percepção da mente de outros. A capacidade de entendem a mente do outro é imprescindível para um grupo de animais que vivem em conjunto, e acontece que a nossa especie vive em grupos.

Essa necessidade de entender o outro, da vazão a efeitos colaterais, ou seja, a capacidade de perceber mentes em objetos ou coisas desprovidas de mente. O céu, uma pedra, um evento climático ou mesmo um sentimento, passam então sobre a perspectiva humana a possuírem vontades e desejos. 

OS PRIMEIROS INDÍCIOS DE COMPORTAMENTO RELIGIOSO

Venus de Willendorf
Formas de religião são muito antigas e remontam a até 300.000 anos atrás, período em que teriam surgido o Homo Sapiens e o Homo Neanderthal. Sabemos que a o comportamento religioso surgiu nesse momento, devido a atividades não naturais ligadas ao que hoje em dia consideramos como religião, como o habito de
enterrar os mortos com pertences. No entanto, formas mais sofisticadas de comportamento religioso, começam a emergir somente em meados do Paleolítico, cerca de 30.000 anos atrás. Nesse período, temos o registro material de diversos objetos com conotação teoricamente religiosa, entre eles, talvez o mais conhecido, a Venus de Willendorf. Essa figura, representando possivelmente uma mulher grávida, tem sido caracterizada como a primeira imagem de uma figura religiosa ligada a fertilidade. 

Sepultamento paleolítico 
Podemos perceber que o pensamento religioso, tem acompanhado nossa especie desde os seus primórdios, o que corrobora  com a teoria da mente. Ao longo de todo o período Paleolítico e do Mesolítico, o comportamento religioso teria se sofisticado, e na revolução agrícola, que teria acontecido por volta de 10.000 anos a.C (periodo Neolítico), teria em conjunto com a vida sedentarizada, criado uma enorme gama de religiões, complexas, centradas no culto à natureza e aos animais.


A ANTROPOMORFIZAÇÃO DA RELIGIÃO 

Quando a civilização sedentária e urbana chegou no seu clímax durante o período conhecido como Idade do Bronze, vemos a emergência de centenas de cidades estados, organizadas em uma classe dominante, detentora das terras e das armas, e outra camponesa. A divisão do trabalho acentuada por essa dinâmica
Deus sumério, Enki
social trouxe a tona novas tecnologias, como a roda, a escrita, a matemática e a metalurgia. Logo, a religião até então voltada à natureza, se voltou para o homem, e os deuses ganharam rostos humanos. Não é a toa que os deuses antigos eram associados a criaturas, como Zeus na mitologia grega, associado ao Boi, ou à Águia. Zeus não era o único a ser associado a esses animais, El, Baal, Hadad, Yawhe, Enki e Teshub, deuses do Oriente Médio e Levante, também eram associados a esses animais. Esses deuses eram patronos dos Céus e das chuvas, regendo a fertilidade das plantações, e por consequência, a sobrevivência desses povos. Não é por acaso que os deuses ligados a chuva e aos céus, tenham lugar de destaque em diversos panteões.

Um desses deuses, ficaria extremamente famoso em séculos vindouros, mas no período de 1000 a.C à 300 d.C, era apenas mais um deus no mundo antigo. Estamos é claro falando dele, o deus dos judeus, dos cristãos e dos muçulmanos, Javé.

UM DEUS SEM NOME

Cultuado pelos povos canaanitas como um deus da fertilidade, das guerras e das chuvas, Yawhe (Javé), era só uma das inúmeras variações dos deuses mesopotâmicos, Teshub e Enki. Durante a expansão do império Babilônico, a região do Levante caiu sobre as armas dos reis babilônicos, o que levou os "hebreus" ao cativeiro, ou ao exílio, depois do evento conhecido como destruição do primeiro templo. Durante anos os hebreus, viveram sobre a sombra da ameaça babilônica, nesse momento, um grande senso de nacionalismo surgiu no seio da sociedade hebraica. Um dos efeitos desse nacionalismo, foi o henoteísmo, ou seja, a preferencia a uma divindade, que era colocada como "a mais poderosa", mas sem deixar de crer em outros deuses, por exemplo, a deusa Astarte, que era então considerada como esposa de Yawhe. 

Após a derrota do império babilônico contra os persas, os hebreus foram soltos do cativeiro, e puderam retornar a suas terras, e obtiveram uma certa autonomia. Ciro, o grande, rei dos persas, foi nomeado pelos hebreus de "messias", que em hebraico significa algo ungido com óleo, algo sagrado. Por ter "libertado" os hebreus, os persas foram então considerados aliados, e por consequência, grandes trocas culturais se seguiram.

Nesse contexto histórico (cerca de 600 à 300 a.C), os persas seguiam o Zoroastrismo, religião monoteísta,
baseada nos ensinamentos de Zaratustra. O Zoroastrismo pode ser classificado como uma religião maniqueísta, onde existe uma clara divisão entre o sagrado e o profano, no caso, os pensamentos bons levam à boas ações, e os pensamentos maus à más ações. O Zoroastrismo, influenciou a religião hebraica em todos os quesitos, inclusive a crença em um futuro salvador, conhecido, no Zoroastrismo como Saoshyan. Mas talvez o maior fator influenciado, tenha sido a crença em somente um deus (O Zoroastrismo não era exatamente monoteísta, pois existiam dois deuses Spenta Manyu, pensamentos bons, e Angra Manyu, pensamentos destrutivos ou maus, mas podemos considera-lá monoteísta).

O monoteísmo então Judaico, iria se desenvolver ao longo dos séculos IV, III e II antes de Cristo, e culminar nos elementos que hoje conhecemos. A Torá (livro sagrado judaico, que compreende o Antigo Testamento cristão), teria sido redigida ao longo de todo o primeiro milênio a.C, contendo inúmeras influencias persas, mesopotâmicas e egípcias. No entanto, todas essa complexidade das religiões do mundo antigo, são apenas um reflexo da complexidade inerente a essas civilizações, mas os fatores que levam os seres humanos a crerem em deuses, ainda são os mesmos.

Na parte II, analisaremos o cristianismo, e o surgimento da ciência na elucidação da questão sobre a existência de deus?

Até lá.








   

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4 comments

  1. Legal o texto :D
    Quando sai o 2?

    Se alguém se interessar em ler, esse também é bom:
    http://super.abril.com.br/religiao/quem-escreveu-biblia-447888.shtml

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  2. Opa E-rick Vieira, tudo bem?

    Agradeço o elogio, estou ainda angariando as informações para a próxima parte, isso leva um tempo mesmo para mim que estudo esse assunto. Até sexta-feira entrego a parte 2.

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  3. Show... voltando apenas para deixar uma dica... link as outras partes aqui para a pessoa acompanhar mais facil...

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