O eu que não sou eu

Ao girar a chave na maçaneta da porta, uma serie de coisas começam a acontecer. Meu corpo levemente altera sua postura original, minha caminhada ganha novos ritmos e a minha face, demonstra a insegurança ou a calma. Ao sair, nos preparamos para sermos alvejados por tiros de "olhares" que nos despem, nos castram ou nos abatem, dependendo da ocasião. O olhar do outro é assim tão poderoso ao ponto de nos controlar? Vivemos por nós, ou vivemos pelos outros?.

Paro e analiso um grupo de jovens, todos juntos sentados ao fundo de um ônibus, seus sorrisos falsos, suas meias palavras, indicam a qualquer mente sensível, um certo grau de falsidade. Naquele momento, fundo em suas mentes, está a verdadeira essência de uma pessoa, o seu real ser. Mas, para agradar ao pelotão de fuzilamento, se vestem com camadas de falsidade, para encobrir suas fragilidades, seus verdadeiros sentimentos. Quem já se perdeu em uma multidão, sabe que é fácil perder o seu "eu" em uma multidão uniformizada, coletivizada e homogenia. Mostrar ao mundo quem realmente somos, seria como um cavaleiro medieval, jogar fora sua armadura, para enfrentar um impiedoso dragão. Colocar para fora, a nossa faticidade, o "eu" sob a camada, e prejudicial, nos despe, nos torna frágeis ao olhares fuziladores. 

Então, quando colocamos para fora o nosso verdadeiro eu, descobrimos que ele é uma farsa, um personagem criado pelas mãos de cem artistas. Ando da forma que ando, pois meu pai costumava arrastar os chinelos pela casa, como do jeito que como, pelas constantes puxadas de orelha da minha mãe. Gosto de assistir aquele programa, por que um familiar sempre me fazia assistir. Uso um determinado tipo de roupa, e penso de uma determinada forma, por que fui condicionado à isso. O ser então começa a perder o seu "ser", já que o que sou, nada mais é que aquilo que outros eram, ou são. Sou o resultado de minhas experiencias, o resultado daqueles que convivo, o resultado do mundo e da época, sou resultado de tudo, menos de mim mesmo. Mas nem por isso, preciso fingir ser aquilo, que não sou.


O centro de tudo, o foco de nada - E outros equívocos humanos.

 "E se tu olhares, durante muito tempo, para um abismo, o abismo também olha para dentro de ti".
Friedrich Nietzsche





Quando olho para o céu a noite, vejo brilhar centenas de estrelas, que de longe parecem tão frias e insignificantes. Ao olhar mais profundamente, percebemos que aquele ponto de luz e muito mais importante do que previamente achamos, e que provavelmente aquele corpo celeste, possui mais significância do que nos mesmos. Ao olhar para o vazio, uma das sensações que mais me ocorrem, e o sentimento de plenitude.

Por que uma estrela brilha? O que é uma estrela? Que criança já não se perguntou sobre isso algum dia. Qual é o meu papel no universo? Ou melhor dizendo, o que é o Universo? Não é a toa que algumas pessoas prefiram respostas rápidas e simples para o seus dilemas, quase como um calmante para a suas tensões mentais. Olhar para o vazio, nos faz sentir plenos, mas ao mesmo tempo nos torna insípidos.

De 200 bilhões de galaxias, vivemos em uma, que possui ao todo, mais de 200 bilhões de estrelas. Por que deveríamos ser assim tão especiais? Tão superiores a tudo que já existiu, ou, existirá. Com que direito nos chamamos de "seres inteligentes"? Por acaso solucionamos todos os problemas do Universo? Claramente a resposta é não. Muito menos solucionamos os problemas existentes em nossa mente. As estrelas brilham, e isso elas fazem muito bem, não por causa de nossa existência, elas apenas brilham. Todo o Universo existe, interage e se transforma, sem ser necessária a ação do homem. Orás, o homem é apenas uma parte do Universo.

Somos material de estrelas, ligados ao mais distante e frio brilho de uma supernova. Ilhados pela escuridão do Universo, desesperadamente tentando encontrar um significado para nossas vidas. Munidos unicamente da capacidade de nos "auto-convencer" de que somos os senhores do mundo, mestres do universo, controladores do tempo.

A maior presunção advinda do intelecto humano, e achar que tudo gira ao seu redor, quando na verdade, somos pó. Poeira de estrelas, primatas egocêntricos, mamíferos narcisistas. Humanos, demasiadamente humanos.
Pensamentos: Excessos da vida cotidiana

Seis horas da manhã, a cidade está em polvorosa, milhões de pessoas saem ao mesmo tempo de suas casas para trabalhar e estudar. Os pontos de ônibus ficam cheios, as avenidas lotadas de carro e a mente saturada pelos barulhos ensurdecedores das cidades modernas. Ninguém ao certo nessa maloca, sabe realmente para onde está indo, mas, eles continuam rumando em direção aos seus "compromissos" e esquecem de seu dever mais celebre, viver!

Quando ainda existe o atraso, causado obviamente pelas vias entupidas da cidade, os supervisores e chefes humilham seus funcionários, como coisas piores do que o ser; somos aos olhos daqueles que sugam nossa energia vital, apenas combustível para alimentar sua riqueza. E nós mesmos cometemos atos irracionais, somos infinitamente arrogantes e estúpidos com o próximo, aquele ser do nosso lado, que passa exatamente por tudo aquilo que passamos e talvez até pior, mas, pelo egoismo dos novos tempos, vivemos em nossas redomas de espinhos, e nosso espaço é inviolável, quando acontece de alguém invadir esse espaço mesmo que sem querer, alguns se tornam animais, e se matam por meros bens materiais.

Até as crianças, futuro da nossa sociedade, herdeiros do mundo, já não mais sabem o valor que a vida humana tem, dão valor ao que é sólido, mas como já dizia a frase "tudo o que é sólido pode derreter", mas a bondade e o bem ao próximo, perduram, e como uma onda, cria novas boas ações.

Não é por vivermos em uma selva de pedra, que nosso coração tenha que ser feito do mesmo material.


Androides e Facebook

Entro no ônibus, e vejo em cada banco uma luzinha piscante, geralmente nas cores azul e branca. Os androides que operam esses dispositivos de luz, carregam constantemente a página principal, tentando através disso, dar algum significado para suas vidas tão vazias. Colocam lá os seus pensamentos mais banais, explicitam as ideias mais vazias e constroem em seus perfis, indivíduos que não existem, sempre felizes, ou sempre tristes, já que é "cool" ser um androide depressivo.
A luzinha piscante brilha incessantemente causando após prolongada exposição, um alto grau de miopia em uma alma já desprovida de visão, uma alma treinada para enxergar somente aquilo que se encontra a 20 centímetros de sua visão. Os androides dançam compulsivamente em baile de mascaras, onde ninguém conhece ninguém, já que ninguém conhece a si mesmo. E quando a página principal da luzinha branca e azul não dá sinais de que o universo gira ao redor dos androides, os mesmos se descarregam, já que para viver e preciso de "Likes".

O eu que não sou eu

O centro de tudo, o foco de nada - E outros equívocos humanos.

Pensamentos: Excessos da vida cotidiana

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